Publicação: 03/10/2025
CNTI
confronta a União Federal e Militância
Sindical avança na luta contra
tributação abusiva do trabalhador
Por Mauro Armindo Filho - Advogado da
CNTI

Trabalhadores em manifestação: a
organização sindical como instrumento de
defesa de direitos.
São Paulo, 30 de setembro de 2025 – Em
uma demonstração de que a militância
sindical não pode aceitar passivamente
os abusos fiscais perpetrados pelo
Fisco, a Confederação Nacional dos
Trabalhadores na Indústria (CNTI)
protocolou hoje uma ação coletiva que
expõe anos de tributação ilegal sobre os
parcos salários dos trabalhadores
industriários paulistas. A iniciativa,
que tramita na 6ª Vara Cível Federal de
São Paulo, representa um marco na
ocupação dos espaços de litigância
tributária pela classe trabalhadora e
poderá beneficiar mais de um milhão de
trabalhadores industriários no Estado de
São Paulo. A CNTI busca estender aos
trabalhadores celetistas a
jurisprudência já consolidada pelo
Supremo Tribunal Federal para servidores
públicos, garantindo que contribuições
previdenciárias indevidas sejam
restituídas à categoria.
Modelo “Guarda-Chuva” Unifica a
Categoria
A CNTI inovou ao
adotar o que chamou de “modelo
guarda-chuva”, uma estratégia processual
que rompe com a fragmentação tradicional
das ações sindicais. Desta vez, uma
confederação consegue unificar em uma
única frente judicial tanto a base
organizada quanto a base inorganizada
dos trabalhadores industriários
paulistas, criando uma força coletiva
capaz de enfrentar a máquina
arrecadatória federal.
Esta unificação foi consolidada em
assembleia histórica realizada em 7 de
maio de 2025, onde sete federações
estaduais deliberaram por unanimidade
delegar à CNTI a legitimidade para
representá-las. As entidades
participantes são: Federação dos
Trabalhadores na Indústria Extrativas de
São Paulo; Federação dos Trabalhadores
na Indústria de Fiação e Tecelagem de
São Paulo; Federação dos Trabalhadores
na Indústria de Papel, Papelão e Cortiça
de São Paulo; Federação dos
Trabalhadores na Indústria de Vidros,
Cristais, Espelhos, Cerâmica Louça,
Porcelana e Ótica de SP; FENATEMA -
Federação Nacional dos Trabalhadores em
Energia, Água e Meio Ambiente; FENATIJER
- Federação Nacional dos Trabalhadores
nas Indústrias de Joalheria.
A estratégia jurídica da CNTI já
demonstra resultados concretos em outras
unidades da federação. Em ação piloto
protocolada em Alagoas em abril deste
ano, na 4ª Vara Federal de Alagoas, na
qual foram parceiras a Confederação
Nacional dos Trabalhadores nas
Indústrias de Alimentação e Afins (CNTA)
e a Confederação Nacional dos
Trabalhadores na Indústria da Construção
e do Mobiliário (CONTRICOM), a própria
União reconheceu parcialmente a
procedência dos pedidos da CNTI,
admitindo expressamente a não incidência
de contribuição previdenciária sobre
verbas como aviso-prévio indenizado,
quinze dias que antecedem auxílio-doença
ou acidente e o abono de assiduidade.
Este reconhecimento parcial pela Fazenda
Nacional em contestação comprova que os
argumentos da CNTI possuem sólido
fundamento jurídico, restando
controvertidas apenas questões pontuais
como horas extras e terço constitucional
de férias gozadas. O precedente alagoano
fortalece significativamente as
perspectivas de êxito da ação paulista.
O Cerne da Questão
O objeto central da
ação da CNTI expõe uma prática
sistemática de lesão aos direitos dos
trabalhadores, isto é, a cobrança
indevida de contribuições
previdenciárias sobre verbas que não
deveriam sofrer tal incidência. Durante
anos, a União vinha descontando INSS
sobre parcelas como horas extras,
aviso-prévio indenizado, terço
constitucional de férias, primeiros
quinze dias de afastamento por doença, e
abono de assiduidade, verbas que não
atendem cumulativamente aos três
requisitos estabelecidos pela
jurisprudência consolidada do Supremo
Tribunal Federal para se caracterizar
como tributável.
A Evolução Jurisprudencial e a Busca
pela Extensão de Direitos
Por um período, o
Superior Tribunal de Justiça (STJ)
aplicava um critério bipartite para
definir a incidência de contribuições
previdenciárias, considerando apenas
dois elementos: a natureza da verba e
sua habitualidade. Esse entendimento
mais restritivo deixava margem para
interpretações extensivas por parte do
Fisco.
O cenário mudou quando o Supremo
Tribunal Federal, ao julgar o Tema 163,
envolvendo servidores públicos federais,
estabeleceu um novo paradigma. A Corte
definiu que, para a contribuição
previdenciária do trabalhador
(diferentemente da patronal, que mantém
o critério bipartite), devem estar
presentes simultaneamente três
requisitos para justificar a cobrança:
habitualidade no pagamento, natureza
remuneratória e, fundamentalmente,
contraprestatividade.
Mas o que significa essa "contraprestatividade"?
É simples: se o trabalhador paga INSS
sobre determinada parcela, ela deveria
aparecer na sua aposentadoria. É a
lógica básica da Previdência Social, o
trabalhador contribui sobre algo que
depois será benefíciado.
Acontece que verbas como horas-extras,
aviso-prévio indenizado, terço de
férias, abono de assiduidade não possuem
contraprestação quando o trabalhador
efetivamente se aposenta. Além disso,
essas parcelas não são pagas
habitualmente, ainda que algumas possuam
finalidade remuneratória.
Imagine pagar seguro do carro sobre um
valor que nunca será considerado em caso
de sinistro, ou contribuir para um plano
de saúde sobre uma base que não dará
direito a nenhum atendimento adicional.
Não faz o menor sentido. Pois é
exatamente isso que a União vinha
fazendo com os trabalhadores há anos.
Como as verbas contestadas na ação não
atendem cumulativamente aos três
critérios exigidos pelo STF para
justificar a cobrança de INSS, sua
tributação é flagrantemente ilegal, e os
trabalhadores têm o direito de reaver
tais valores.
Embora essa jurisprudência tenha sido
consolidada inicialmente para servidores
públicos, a CNTI sustenta que os mesmos
fundamentos se aplicam aos trabalhadores
da iniciativa privada. A ação busca
justamente essa extensão, argumentando
que os princípios
tributários-constitucionais exigem
tratamento uniforme entre os regimes
previdenciários.
A Omissão da União Federal
Um aspecto
particularmente relevante destacado pela
CNTI é que a própria Procuradoria-Geral
da Fazenda Nacional reconhece, em suas
orientações internas, a procedência
desse entendimento para diversas verbas.
As Notas PGFN/CRJ nº 115/2017 e nº
485/2016 admitem expressamente a
distinção jurisprudencial sobre essas
parcelas, orientando inclusive a
dispensa de contestação em ações
similares.
Mesmo assim, a União nunca estabeleceu
mecanismos efetivos para devolução
espontânea dos valores indevidamente
arrecadados. A CNTI argumenta que havia
um dever legal de restituir esses
valores, mas a omissão federal obriga os
trabalhadores a buscar o Judiciário para
reaver quantias que nunca deveriam ter
sido cobradas.
O Impacto da Ação para os
Trabalhadores
Se procedente, a ação
da CNTI beneficiará a maior parte dos
trabalhadores industriários do estado de
São Paulo representados pela
confederação, independentemente de
filiação sindical específica. A decisão
garantirá a restituição dos valores
pagos indevidamente nos últimos cinco
anos, respeitando o prazo prescricional.
Além do aspecto financeiro, a iniciativa
da CNTI representa um marco na
utilização de instrumentos jurídicos
coletivos para defender direitos
previdenciários da categoria. A
organização sindical pode e deve ocupar
espaços de litigância tributária de
forma eficaz, contestando práticas
arrecadatórias que lesam os
trabalhadores.
A expectativa é que esta ação estabeleça
um precedente importante, não apenas
para os industriários paulistas, mas
para toda a classe trabalhadora
brasileira. A CNTI pretende expandir
este projeto para outros estados da
federação, replicando o modelo
"guarda-chuva" que unifica a defesa
tanto da base organizada quanto da base
inorganizada dos trabalhadores
industriários. O objetivo é demonstrar
que a jurisprudência consolidada pelo
Supremo Tribunal Federal deve ser
aplicada de forma isonômica em todo o
território nacional, independentemente
do regime previdenciário ao qual o
trabalhador está vinculado, garantindo
que milhões de industriários brasileiros
tenham acesso aos mesmos direitos
previdenciários já reconhecidos para os
servidores públicos.
A CNTI, com esta iniciativa, reafirma
seu papel como entidade de defesa dos
direitos tributários-previdenciários dos
trabalhadores industriários.

|