Publicação: 12/11/2015
MINERAÇÃO
Relatório
aponta muitos acidentes no setor da mineração
Audiência lembra tragédia em Mariana ao
debater pesquisa que aponta necessidade de melhora nas condições de
trabalho.
O relatório
técnico, realizado pela Fundacentro e pela CNTI, foi apresentado durante
audiência pública da Comissão do Trabalho -
Foto: Sarah Torres
As condições de trabalho no setor de mineração precisam melhorar para
que haja a redução da mortalidade e dos danos à saúde do trabalhador. A
conclusão é do pesquisador da Fundacentro, Celso Amorim, um dos
responsáveis pela pesquisa "Identificação, mensuração e análise dos
acidentes, doenças e mortes no setor mineral: construção de modelo de
monitoramento das condições de trabalho e saúde dos trabalhadores".
O
relatório técnico, realizado pela Fundacentro, entidade vinculada ao
Ministério do Trabalho, e pela Confederação Nacional dos
Trabalhadores na Indústria (CNTI), foi apresentado durante audiência
pública nesta quinta-feira (26/11/15), na Assembleia Legislativa de
Minas Gerais (ALMG). A reunião foi promovida pela Comissão do Trabalho,
da Previdência e da Ação Social.
A pesquisa, concluída em 2012, coletou dados dos 34 municípios mineiros
do Quadrilátero Ferrífero, onde a mineração tem papel fundamental na
economia. Entre os anos de 2004 e 2008, foram registrados 1.967
acidentes. Houve 11 mortes, 104 internações e 16 trabalhadores tiveram
que se aposentar, com média de idade de 52 anos. A perda de audição
parcial ou total, ferimentos no punho e nas mãos e doenças respiratórias
estão entre as maiores preocupações. Para Celso Amorim, o “quadro de
saúde do trabalhador precisa melhorar, e muito”.
Dos 1.967 acidentes, 85% estão relacionados à perda de audição e a
lesões nas mãos e no punhos. Outro dado da pesquisa mostra que a média
de horas trabalhadas até a ocorrência do acidente é de 4 horas.
“Mecânicos e profissionais responsáveis por manutenção de máquinas em
geral possuem 120 registros de acidentes, seguido por mineiros (108) e
operadores de caminhão de minas e pedreiras (51)”, afirmou o
pesquisador. Com relação aos óbitos, a maior frequência ocorre entre
homens de 30 a 39 anos.
De
acordo com Amorim, a pesquisa contribui de forma pioneira para o
monitoramento de fatores que possam prejudicar a saúde do trabalhador.
“Esta é uma das conclusões do estudo: faz-se necessário monitorar esses
fatores de forma a evitar danos e acidentes”, reforçou. Para o
pesquisador, outra conclusão que se pode obter do relatório é que há
subnotificação dos acidentes de trabalho no setor mineral. “É uma das
atividades de maiores riscos à saúde do trabalhador”, destacou.
Taxa de mortalidade – Segundo Celso Amorim, dados mais recentes,
de 2012, mostram que a taxa de acidentes no setor foi de 2,7 por 100
trabalhadores. “O setor ocupa a quarta posição no ranking nacional e a
quinta em Minas, em termos de acidentes de trabalho”, contou. “A taxa de
mortalidade, no Brasil, foi, à época, 22,1 por 100 mil trabalhadores, a
segunda maior do País”, acrescentou. Ele disse, também, que, entre 2002
e 2012, houve mais de 50 mil acidentes na extração mineral. Minas teve,
no período, cerca de 14 mil acidentes.
Para a diretora de Saúde do Trabalhador da Secretaria de Estado de Saúde
e uma das pesquisadoras do relatório técnico, Marta Freitas, “a pesquisa
mostra o tanto que o trabalhador da mineração é desprezado”. Ela
considera que os dados mostram desrespeito aos profissionais e concorda
com Celso Amorim sobre o fato de que há subnotificação das mortes e dos
acidentes de trabalho no setor. “O aumento da produção não é
proporcional ao aumento do número de trabalhadores. Isso pode explicar
um pouco os dados apresentados”, salientou.
O
presidente da Federação dos Trabalhadores nas Indústrias Extrativas do
Estado de Minas Gerais (Ftiemg), José Maria Soares, afirmou que,
enquanto o lucro do empresariado for mais importante que a vida, mortes
e doenças dos trabalhadores da mineração vão continuar ocorrendo.
Convidados dizem que desastre em Mariana foi criminoso
Além da pesquisa, a tragédia ocorrida em
decorrência do rompimento de uma barragem de rejeitos da mineradora
Samarco, em Mariana (Região Central do Estado), ganhou destaque na
audiência pública.
Para o diretor do Sindicato Metabase Inconfidentes e membro da Executiva
Nacional da Central Sindical e Popular (CSP) Conlutas, Rafael Ávila, o
caso “abre uma ferida que está sangrando há muito tempo”. Ele acredita
que o ocorrido deva ser considerado um acidente de trabalho. “Mais do
que isso, foi um crime da Samarco e de suas proprietárias (Vale e BHP
Billiton)”, afirmou. Ele defendeu a reestatização do setor mineral no
País. “É importante culpabilizar empresas pelo acidente e também todas
as esferas de governo do Brasil”, acrescentou.
A
representante da Secretaria de Estado de Saúde, Marta Freitas, concordou
com Rafael Ávila. “Foi um desastre criminoso em Mariana”, pontuou. Ela
criticou o fato de os meios de comunicação estarem divulgando o caso
apenas como um acidente ambiental. “Foi um acidente de trabalho que
causou danos ao meio ambiente”, ressaltou.
Ela contou que está sendo formado um grupo constituído por membros das
Universidades Federais de Minas Gerais (UFMG) e de Ouro Preto (Ufop)
para monitorar a situação das pessoas que vivenciaram o acidente e foram
expostas à lama. “É preciso um estudo para saber se essas pessoas estão
sujeitas a doenças de pele; a doenças mentais, devido ao estresse
pós-traumático; à intoxicação; e até mesmo ao câncer. Não se sabe como a
saúde dessas pessoas serão afetadas diretamente”, pontuou.
O auditor fiscal do Trabalho, Mário Parreiras de Faria, concorda que a
denominação correta dada ao ocorrido em Mariana deva ser “acidente de
trabalho”. Ele se mostrou preocupado com a segurança de trabalhadores
que estão fazendo, atualmente, algum tipo de trabalho no local. Para o
presidente da Ftiemg, José Maria Soares, ocorreu em Mariana “um crime
contra a humanidade”. Ele também criticou a falta de fiscalização em
barragens.
De
acordo com o diretor da Secretaria de Educação da CNTI, José Reginaldo
Inácio, o trabalho no setor mineral só ganha visibilidade quando ocorrem
tragédias como a provocada pela mineradora Samarco. “Samarco, Vale e BHP
têm que assumir suas responsabilidades e pagar por isso”, destacou.
Ele apresentou um documento, assinado pelos deputados Celinho do
Sinttrocel (PCdoB), autor do requerimento para a reunião, e Geraldo
Pimenta (PCdoB), com pedido de providências à Samarco com relação a
trabalhadores que estão perdendo empregos em consequência do desastre.
Outra reivindicação aceita pelos parlamentares, na forma de
requerimento, foi a realização, pela ALMG, de uma conferência estadual
para debater situação do setor minerário no Estado.
Os convidados da reunião solicitaram, ainda, contribuição da Assembleia
para pressionar o Congresso Nacional com o objetivo de possibilitar a
participação popular e de movimentos sociais na elaboração do novo Marco
Regulatório da Mineração, que tramita em Brasília.
Deputados criticam situação do trabalhador na mineração
Parlamentares relembraram que
ainda existem trabalhadores desaparecidos após o desastre em Mariana -
Foto: Sarah Torres
Segundo o deputado Celinho do Sinttrocel,
para garantir lucros, “o capital aprofunda seu descaso com a força do
trabalho e a segurança dos trabalhadores”. Ele disse, ainda, que o
acidente em Mariana abre a oportunidade para que o tema seja tratado com
a “radicalidade” que merece. “O nervo foi exposto e toda sociedade
brasileira está indignada e busca respostas imediatas para o pior
desastre da histórica ocupacional e ambiental de Minas Gerais”, afirmou.
Segundo ele, as maiores vítimas foram as classes populares e o mundo do
trabalho. “Onze trabalhadores ainda estão desaparecidos e uma imensidão
deles teve suas vidas afetadas”, pontuou.
Na opinião do deputado Geraldo Pimenta, a luta do movimento sindical nas
últimas décadas foi fundamental para reduzir número de acidentes e
mortes laborais. “Isso faz com que a gente não desanime e continue
lutando por melhores condições de trabalho”, frisou.
Requerimentos – O deputado Celinho do Sinttrocel disse que vai
apresentar, na próxima reunião da comissão, uma série de requerimentos
referentes ao assunto da audiência. Um deles será um pedido de
providências ao Ministério Público do Trabalho para que instale
inquérito para reparar prejuízos a trabalhadores causados pelo
rompimento da barragem em Mariana e para que reconheça a legitimidade de
sindicatos como emissores de notificações de acidentes de trabalho.
Também vai solicitar um debate público para discutir impactos da
mineração no Estado e, ainda, enviar ofício ao presidente da Câmara
Federal para que seja realizada ampla discussão sobre o novo Marco
Regulatório da Mineração, antes das votações.
Por fim, a comissão aprovou requerimentos dos deputados Celinho do
Sinttrocel e Rogério Correia (PT) para realização de audiência com
objetivo de debater pauta de reivindicações de trabalhadores da Cemig e
de trabalhadores da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes).
Fonte: Assembleia de Minas
|